sexta-feira, 15 de junho de 2012

Voou.



E de repente atingiu-me.
20 anos.
Vinte anos.
Foram 20 anos a estudar.
Desde a manhã fatídica em que a minha progenitora me depositou na Voz do Operário e a senhora-assaz-fofinha me perguntou se eu queria dizer o meu nome aos outros meninos ou se queria que fosse ela a fazer as apresentações.
Já naquela altura o instinto me dizia que tinha de ser pró-activa, de não mostrar medo, ou estava fodida. E lá disse a todos que me chamava Info-Excluída e que gostava de bife com batata frita (não foi logo no mesmo instante, mas na pré-primária isto era informação muito importante).
Atingiu-me agora que a época dos cadernos acabou. E a época dos lápis e das lapiseiras. E a época das borrachas e do corrector. Setembro nunca mais vai ser sinónimo de blocos de folhas a cheirar a novo (e eu gosto (ou gostava? Já será pretérito?) desse cheiro).
Porque finalmente acabei aquilo que comecei há 20 anos atrás.
A primeira coisa que disse ao meu irmão foi: "nunca mais volto a estudar". Não sei porquê. Eu não desdenhei estudar. Até tinha um certo jeito (só demorei vinte anos, há quem demore mais).
O D. pergunta sempre se tenho saudades.
Não tenho saudades.
Tenho saudades dele, do bar velho, do tempo em que as minhas amigas ainda davam sinal de vida (até o meu bicho acha esquisito eu ser a única fêmea viva que nunca sai com amigas), de tardes enfiadas na biblioteca a contar os minutos que faltavam para o lanche.
Demorei vinte anos a acabar isto. Claro que não foram vinte anos focados nisto. Houve momentos "quando for grande quero ser professora", depois "professora de história" (e pensar que hoje em dia sou dotada de tão pouca paciência. Seria uma fila sem fim de paizinhos com hora marcada para ralhar comigo por ter ralhado com os rebentos), depois "jornalista" até acabar no Antro.
E o Antro tem um jeito muito próprio de se infiltrar na gente.
O Antro é microondas que nos cozinha de dentro para fora.
O Antro deve ser daquelas coisas estilo "Cinema Paraíso". Vão ser precisos muitos anos para querer lá voltar. Para senti-lo meu. Para ter saudades Dele e não de mim e de nós todos dentro Dele.
Atingiu-me agora que acabei.
Uma pessoa passa a vida a sonhar com um momento e quando ele chega passa a voar. E nem o sentimos. Foi um dia igual aos outros. Passou. Voou por mim. Aconteceu e eu não tive tempo para me preparar para ele. Para comemorar, para rir, para chorar, sei lá.
Só sei que acabei.